Comunidades Kaingang, Avá-Guarani e Kaiowá são atacadas em três estados neste final de semana
Em semana de acentuada violência contra indígenas, comunidades Avá-Guarani, no Paraná, Guarani Kaiowá, no Mato Grosso do Sul, e Kaingang, no Rio Grande do Sul, sofreram ataques armados |
Os Kaingang da Retomada Fág Nor, em Pontão (RS), município localizado próximo à cidade de Passo Fundo (RS), sofreram dois ataques em menos de cinco dias, depois que as famílias decidiram retornar para uma área próxima ao seu território originário.
Os indígenas do povo Kaingang foram expulsos de sua terra no ano de 2014. Ruralistas da região, articulados por parlamentares de partidos extremistas como PP, Republicanos e PL, não aceitam que os povos indígenas tenham o direito de viver em suas terras originárias.
A comunidade da retomada Fág Nor, além de requerer o reinício dos estudos de identificação e delimitação de suas terras, paralisados na Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), busca também dar visibilidade à realidade de absoluta vulnerabilidade dos povos indígenas no estado do Rio Grande do Sul.
O retorno dos indígenas ao seu território ocorreu na segunda-feira, dia 9 de julho. Na noite seguinte, 10 de julho, pessoas armadas passaram pela rodovia e dispararam várias vezes sobre os barracos, que estão situados às margens da estrada, num espaço de terra de domínio público, pertencente ao Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT). Ou seja, os Kaingang não ocupam terra privada, mas apesar disso são atacados.
Na madrugada de sábado (13) para domingo (14), homens armados atearam fogo num veículo da comunidade, que estava estacionado em frente aos barracos onde os indígenas se abrigavam do frio e da chuva.
Os ataques aos Kaingang da Retomada Fág Nor, apesar de reincidentes, não são isolados. Nessa mesma noite de sábado (13), fazendeiros do Paraná atacavam a retomada Avá-Guarani Arapoty, na Terra Indígena (TI) tekoha Guasu Guavirá. Além de dispararem com armas de fogo sobre as famílias Avá-Guarani, os agressores queimaram os barracos e todos os seus alimentos.
Já durante a tarde de domingo (14), grupos de fazendeiros também iniciaram ataques armados contra os Guarani Kaiowá que estão em retomada no território de Panambi – Lagoa Rica, em Douradina, Mato Grosso do Sul. Durante os ataques, um indígena foi baleado no tekoha Guayra Kamby’i, que integra o território. A TI Panambi – Lagoa Rica já é uma terra oficialmente reconhecida, identificada e delimitada com 12,1 mil hectares no ano de 2011. Porém, desde então sofre com a inércia do Estado e segue com o processo administrativo de demarcação paralisado.
Judicialmente, para além da negligência estatal, o território é alvo de uma ação dominial que se encontra no Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) sem resolução. De 2011 até o presente, sem poder contar com seu direito garantido, diversos grupos Kaiowá tentam retomar pequenas partes de sua terra, buscando condições mínimas de sobrevivência. O território, que deveria ser base para vida e cultura dos Kaiowá e Guarani, tem sido palco de ataques e confrontos com fazendeiros.
Em 2015, em um dos pesados ataques paramilitares sofridos pelas comunidades indígenas da região, o Ministério Público Federal (MPF) interceptou comunicações dos fazendeiros que planejavam ataques ordenados e articulados contra os indígenas. A Aty Guasu emitiu um pedido de socorro e teme um novo massacre no Mato Grosso do Sul se as autoridades não agirem rápido no sentido de garantir a integridade física dos Guarani e Kaiowá.
O que há de comum nesses ataques, além da covardia e crueldade? Existe uma naturalização da violência que é avalizada pela inércia dos órgãos federais – que têm comprado, em boa parte dos casos, a versão do opressor – e, principalmente, pela manutenção em vigor da Lei 14.701/2023, que deturpa a Constituição Federal e foi promulgada à revelia da decisão da Suprema Corte que reafirmou os direitos dos povos indígenas.
Sentindo-se legitimados pela vigência de uma lei inconstitucional, os ruralistas têm atacado aos olhos de todos, à luz do dia ou na calada da noite, em qualquer tempo, sempre com certeza de impunidade.
A ocorrência de tantos casos de violência, com as mesmas características e num mesmo período, dá a certeza de que estas ações criminosas são conectadas e articuladas entre si, visando reprimir os povos e afrontar seus direitos.
O Conselho Indigenista Missionário (Cimi), uma vez mais, denuncia esses casos de violência e pede a adoção de medidas políticas, jurídicas e administrativas no sentido de assegurar proteção aos indígenas e garantir que os agressores sejam responsabilizados criminalmente e que as terras indígenas sejam demarcadas.
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